APRESENTAÇÃO


Quens sou Eu?


Já se terão passado mais de dez anos desde que escrevi a primeira peça deste volume.

Era na Alemanha, sob um frio polar e uma reclusão beneditina. Talvez a estranheza do ambiente e a saudade da minha língua contribuíram para que, após oito anos de decidida recusa em voltar a redigir poemas, eu enfim cedesse a ouvir alguns versos sussurrados ao meu ouvido e os registrasse num guardanapo ou sobre a palma da mão. Claro que acredito em inspiração, com o mesmo fervor devoto com que desacredito em fadas ou musas. Infelizmente para os menos crédulos, a inspiração é sim algo que vem de fora, mas não de alguma possessão divina ou de uma canalização mediúnica. Abebera-se de fiapos de conversas, placas luminosas vistas em relance, refrões de música vagabunda, uma indistinta melodia que se escuta ao dormir (movimento browniano?) ou, enfim, quem sabe, a partir das alucinações auditivas geradas pelo ruído do calefator e o som do tecno industrial escapando da loja militar do subsolo de minha modesta Hauswirt. Toda uma balbúrdia que, uma vez internalizada e somada ao tesouro indestriçável do subconsciente, foi sendo inconsciente e obstinadamente retrabalhada a despeito de minhas reservações até que, por descuido, uma dose de Schnapps a mais, uma noite mal dormida, conseguiu romper a barreira da atenção consciente e me surpreende com sua beleza intemporal e a sua profundidade atordoadora.

Ai estilo digressivo! Sou uma mente desorganizada. Começo onde deveria terminar, depois volto a falar sobre um ponto pelo qual não havia ainda sequer passado. Repito algumas vezes os mesmos temas até que irrompam os bocejos dos que tentam me alertar com o gesto generoso de que me delongo, me extravio, me desalinho com as tranças despenteadas das palavras. Costumava ser bom domador de sentenças. Conhecia-lhes cada tique, cada amuo silencioso ou rosnado recalcado, mas também os seus perigos. Com essa original maestria, normal numa mente jovem, acesa para a novidade do mundo, escrevi meu primeiro livro O Céu das Ideias Fixas, muito superior a toda aquela pasmaceira que se escrevia naqueles dias, mas que nunca logrei publicar, seja por uma congênita timidez, seja por uma cultural herança de iniquidade que, neste país, premia os bem nascidos ou bem relacionados em detrimento dos critérios de mérito.

Quanto ao meu antigo jugo sobre palavras, hoje descuido em cuidar disso, ou melhor, cuido em descuidar delas. Deixo que me enganem, que se esquivem, que se mudem para a Bahia, que é terra boa, sem deixar endereço. Tanto faz. Todo mundo se encontra no Farol, ou num terreiro, que é preciso temer a santeria. Mas guardo sempre comigo aquelas poucas palavras com que me sirvo para dizer a mim mesmo o que me ocorre dizer, salvo se ainda nisso me equivoco. E quanto mais simples as palavras, mais poderosas, mais originária e poderosamente poéticas. Abomino o hábito difuso em outras línguas como o italiano, o francês, o alemão e o inglês, segundo o qual escrever bem é eleger construções raras, à borda da ininteligibilidade. Nisso, brasileiros, lusitanos, espanhóis e latinoamericanos recebemos, pelas vias tortas de nossa incompetência, o tino de um instintivo senso de bom gosto: redigir bem é ser claro, pois a escritura visa à comunicação, e é, por isso, mais que qualquer outro, um ato de amor. Para que dizer cárcere, se os pobres pagam pela injustiça dos brancos na cana mesmo?; porque escrever libido, quando o que sinto se chama tesão?

Então me satisfaço com minha rala gama de palavras. Quem sabe um gênio maligno se divirta em me fazer imaginar que penso com meu parvo vocabulário o que penso que penso, quando o que cogito com ele é o contrário do que cogito de que cogito.? Mas, apesar de divertido o pensamento, é óbvio que palavras servem para veicular pensamentos, não para pensar. Ninguém, salvo talvez alguns enfermos, pensa com palavras. E ainda é correntio nos meios humanísticos que se assevere que a linguagem natural molda o pensamento, a despeito de todos os atinentes experimentos das neurociências apontarem contundentemente para o sentido oposto (refiro-me à a famigerada tese Shapiro, sufragada pela filosofia de poltrona de Quine e Kuhn, e até por um verdadeiro gênio como Caetano Veloso, que em certo verso insinua que só seria possível filosofar em alemão, o que é um ledo equícovo, não só porque pensamento nada tem a ver com linguagem social como porque, dos idiomas que conheço, o alemão é de longe o mais enquadrado e limitadoramente inexpressivo). Pensamos sim com meias-referências, implicaturas truncadas, raciocínios de hipóteses eleitas às pressas segundo um cálculo expedito de plausibilidade, enfim, por meio de uma linguagem do pensamento entendido como capacidade congênita de manipular de signos e não como mera fala ou produção numa língua social como o português ou o espanhol, e aceitamos as conclusões a que chegamos rotineira e instintivamente como provisórias, porque só fanáticos têm certezas, e a vida ensina que estas jamais duram o bastante. Há, a esse respeito, na literatura científica o registro de centenas de casos de crianças e mesmo adultos que, criados em isolamento, nunca aprenderam uma língua natural, ou melhor, social, pois a língua natural é a do pensamento (com que nos dotou a evolução genética), e que só aprenderam linguagens sociais tardiamente, quando puderam narrar aos investigadores suas vidas e pensamentos pregressos. A linguagem social com que nos comunicamos (o mandarim ou o inglês) são simples convenções sociais moldadas e aperfeiçoadas pela interação secular, e as quais simplesmente não teriam existido se não existisse uma linguagem do pensamento pré-moldada nos nossos cérebros, como etapa necessária para que possamos aprender qualquer linguagem social.

Anos sem conseguir publicar agastaram minhas relações com a poesia. Para que serve um poeta sem um público? Pois o que um poeta deseja é ter um público, ser ouvido, enfim, ter uma voz. Não para fazer dinheiro ou ser famoso. Quem quer fazer dinheiro não escreve poesia, escreve romances teens, trabalha no mercado financeiro, vende estupefacientes, se expõe num reality show. Um poeta quer simplesmente dividir com os outros aquele achado, quer propiciar aos seus semelhantes a maravilha e o prazer da beleza que ele por acaso descobriu. A poesia, repito, é um gesto de amor. Por isso, quem quiser ler estes ou outros poemas meus os achará abundantemente na internet. Por favor, os copiem se lhes agradarem, mostrem a quem, reescrevam se os inspiram.

Retomando a fiada, rompi com a poesia por algum tempo. As ideias, é claro, se avolumaram, e então me obriguei a redigir a ponta de lápis um desconcertante conto-novela, que prometo em muito breve converter em romance. Chamava A Gaiola, e inquiria se quem estamos na gaiola somos nós ao invés do periquito Getúlio, presos entre metas e expectativas no mais das vezes alheias e nunca genuinamente por nós mesmos elegidas. Alguns anos depois, sucedeu a viagem a Berlim. Toda a inspiração represada rebentou, e eu me revi em voltas da necessidade incontornável de reescrever poesia... O primeiro poema, escrito sob inspiração benjaminiana (estava eu diante das Passagen, assistindo ao seu ocaso ante à ereção dos malls e contemplando a felicidade posta à venda nas vitrines. Assistia às ruínas da civilização recicladas como cartões postais (a Gedächtniskirche, por exemplo, ou o Checkpoint Charlie), em frente às aras do Deus da Razão imolado como um herói inocente pela culpa de não saber ter culpa.

A influência de Benjamin, que então me embrigava, hoje me parece, sem pretender soar cínico (em que depois me converteria ao redigir meu livrinho predileto em homenagem ao meu colega de bebedeiras e intempéries Diógenes de Sinope), bastante curiosa. Ou simplesmente jovialmente romântica. Mas em nada prejudica os poemas escritos sobre sua inspiração: um poema tem sempre várias camadas, e é uma violência impor-lhes uma interpretação unívoca. Somos, também, afinal de fato muitos, os muitos que sucedem no curso de muitos dias, e a cada manhã morremos com tamanha assiduidade que, em um dia plano como qualquer outro, desaprenderemos a morrer. E é então que começa a verdadeira viagem. Porque a vida, a verdadeira vida, e o digo com mais credenciais porque nunca fui religioso e até hoje resisto em ser ateu, só existe na eternidade, mas isso só se compreende com o tempo, à medida que aprendemos a enxergar através dele.

Em homenagem ao poema que psicografara entre uma nevasca e outra e que reinaugurava minha atividade poética, resolvi batizar o livro que nascia Inverno em Alemão, com base em uma tardia tradução em inglês que vertera o título do primeiro poema do livro, Inverno Berlinense, em Winter in German.


Por Que escrevo Poesia?

É difícil conceber as dificuldades envolvidas em se escrever um livro de poesia. Na prosa, a narrativa conduz a imaginação do escritor e facilita a leitura do leitor. Já na poesia, cada palavra é pensada exaurientemente, e todo verso é por conseguinte absolutamente inicial. Estamos sempre de novo à casa zero, sem o suporte do que já foi dito. Conheço uma pletora de romancistas que nunca corrigem seus textos, o que me provoca certo horror íntimo. Mesmo entre meus prosadores prediletos, não deixo de me agastar com personagens deixados pelo meio ou com a sensação de que alguém que se propõe a escrevinhar trezentas páginas não tem total conhecimento de aonde quer chegar nem pode humanamente tratar a contento toda a pletora de informações que vão inevitavelmente se acumulando. Para um poeta, isso não tem outro nome senão desleixo. E, por isso, criado numa atmosfera de disciplina luterana, não tive escolha senão me tornar um poeta.

Mais difícil ainda é publicar poesia. É certo que a maioria dos livros que se dizem de poemas são blablablá oligofrênico. Isso concedido, que a maioria avassaladora dos leitores ainda assim prefira ler calhamaços de narrativas redundantes e mal-costuradas a ler versos dotados de uma concisão e profundidade que ultrapassam em proveito e prazer o conteúdo desses frankensteins me deixa indignado. Considerem ainda o fato de que um livro de poemas costuma ser mais barato e breve, poupando portanto o custoso tempo do leitor e lhe aliviando o bolso. Outro dom fantástico da boa poesia é o de aderir a memória: bons versos serão sempre lembrados. Já um romance, chegado à página quinhentos, o desafio para que me narre todos os eventos anteriormente sucedidos. Ao fim de seis meses, sua lembrança será nula. Talvez as linhas gerais, o nome de um ou outro personagem. Você inevitavelmente terá de se socorrer da sinopse do livro na wikipedia. E todo o tempo investido na leitura das alentadas páginas terá retorno zero.

Obviamente razões poderosas justificam o fenômeno dessa preferência da prosa pela poesia por parte do grande público. Primeiramente, o fato de a poesia ser inerentemente plurívoca. Ela exige a contribuição ativa do leitor para completar-lhe os sentidos, para derivar suas consequências, para trazê-la para a intimidade de seu mundo intersocial e pessoal. Já na prosa, o leitor vai sendo conduzindo pela história, mais ou menos como num seriado de TV. Por isso, Haroldo de Campos prenunciou a substituição da prosa narrativa pelo audiovisual. Receio que talvez lhe assista razão. Hoje medram os audiobooks, que são uma mão na roda para quem perde quatro horas diárias comutando de casa ao trabalho e inversamente nesta feia e dura flor chamada São Paulo.

Em outras palavras, o leitor está muito cansado ou assoberbado (eufemismo para preguiçoso) para ter que pensar com a poesia e prefere ser pensado pela prosa. Meus amigos sempre reclamam que eu nunca sou companhia para o cinema. Para ser franco, acho cinema uma linguagem para adolescentes, como a prosa é distração para quase-adultos. Passei da idade para ver graça em tais coisas, ainda mais por serem sempre tão redundantes. Quando me contam um romance, bastam três palavras, e eu adivinho o final. A vida ensina que as suas possibilidades, embora repetíveis ad infinitum, são esgotáveis. Isso Aristóteles lamentou na Poética. Mas essa limitação também é a condição para a possibilidade da busca da verdade, que é a investigação do universal. Abomino a vulgaridade dos fatos mas venero a beleza de toda teoria. De uma forma ou de outra, definitivamente, os prazeres da narrativa não são para mim.

Quanto ao prevalente realismo-psicológico há mais de século em voga entre os romancistas e tão apreciado pelos norte-americanos, não me parece nem realista nem psicológico. Não é realista porque baseado no obscurantismo de fringe-sciences como a psicanálise e a psicologia. É óbvio que uns 90% de nossa vida consciente e inconsciente transcorre sob o domínio implacável do acaso, e sobre ele não há mais a ser dito senão que acontece todo o tempo... Além disso, disciplinas mais sérias como a microeconomia e a biologia evolutiva ensinam mais sobre a atitude e a natureza dos homens do que essas empoeiradas especulações que confundem caráter com herança ou com circunstância. Do prisma mais estritamente artístico, investigar as pretensas ruminações de um homem qualquer invariavelmente esconde no seu pano de fundo uma trama deploravelmente banal. Não estou interessado como certo personagem prefere vestir o pijama antes de dormir, ou se fulana amava mais ciclano que beltrano com quem, por execráveis incompatibilidades sexuais, acabou não se casando... Ora, isso é problema privado deles, desculpe, não estou interessado.

Para piorar o quadro, mais artificial que uma narrativa do tipo la marquise sortit à cinq heures é tentar camuflar o artificioso da prosa de ficção através de expedientes de fluxo de pensamentos, diletos das vanguardas velhas e novíssimas: como expliquei acima, ninguém pensa com palavras, disfarçar as convenções da narrativa fazendo os personagens falarem consigo mesmos é tão fabuloso como marcar os intercâmbios de um diálogo dizendo que fulano se retesou ou mudou de tom. Tudo somado, não acredito em realismo psicológico. A verdadeira literatura bebe do fantástico, do tesouro atemporal da saga humana e que hoje se desdobra na ciência-ficção, ainda que falte no mais das vezes talento estilístico a seus autores, mas que cumpre ainda assim o papel de fonte de novos caudais de reflexões e desafios... Quanto ao artificialismo, a poesia o assume como seu instrumento e não sente honestamente vergonha disso. Nunca procura parecer o que não é nem poderia ser. A poesia se pretende um artifício porque toda obra de arte o é. As Cataratas de Iguaçu são inefavelmente belas, mas isso não as torna uma obra de arte. A arte é fruto do trabalho do homem, é portanto um artefato, um artifício.

Em segundo lugar, a par da maior exigência de um livro de poesia em face dos leitores, reputo que estes devam também preferir a prosa de ficção pela razão de que escrever boa poesia é tão dispendioso, consome tantos anos, que é natural que existam muitos mais bons romances que bons poemas. E, desta maneira, a oferta determina a demanda, e a demanda determina o hábito (meu raciocínio econômico aqui é intencionalmente heterodoxo, por favor, nunca levem à risca o que digo, desistam de adivinhar quando falo sério ou apenas provoco). Daí porque não deveria ser tão chocante que eu tenha levado dez anos para conseguir, sabe Deus sob quantas tribulações, publicar este volume. Mas basta com as minhas ladainhas, vamos ao livro!

Um Livro em Três Metades

Reuni os poemas que compus durante o período de 2001 e 2005. O capítulo inicial, escrito entre 2001 e 2003, têm dicção pós-moderna e às vezes quase-falsamente-prosaica. Diálogo com escritores e poemas predecessos. Sinto a influência de meus diletos contemporâneos, de minha paixão por Fernando Pessoa, de Décio Pignatari e dos irmão Campos, do meu genial conterrâneo Paulo Leminski, da imagística americana e do irregular mas decisivo T.S. Eliot. Esses poemas, que exploram as possibilidades da linguagem e da prática poética, reuni num capítulo denominado Variação e Recorrência (para os menos nerds, essa é uma das definições de "poesia", embora a que eu prefira seja a que a conceitue como a crítica da vida - "the criticism of live", Matthew Arnauld: e que belo achado, tiro o chapéu!, quer dizer, o boné, pois, se a definição não for verdadeira, é bem inventada!). Em último juízo, o capítulo trata do fazer poético e é, portanto, um exercício de metapoesia.

A partir de 2003, acometido por um arroubo delirante e maníaco, decidi que já havia contribuído o bastante com o cânon ora dominante, e que havia mesmo progredido para além das cartilhas com algumas radicais intervenções pós-pós-modernas no anterior O Céu das Ideias Fixas (por exemplo, alguém me explique as descolagens, citações falsas, contra-homenagens, paródias sinceras e anacronismos de Os Dias Árabes, por exemplo). Resolvi então desafiar o regime posto, escrevendo poemas sobre aqueles temas acima de todos execrados, ridicularizados, desconsiderados e proibidos: o amor e a solidariedade humana.

Primeiro vieram os socialmente engajados, que não me ocuparam muito,
talvez seis meses, e que renderam poucos exemplares. Me vali das lições de Gilberto Mendes Teles, Affonso Romano de Sant'Anna (poxa, que nome bonito!), João Cabral de Mello Neto, Eduardo Alves da Costa, Bertolt Brecht, Vinícius de Moraes, Sophia de Mello Anderson e Carlos Drummond de Andrade. Reuni-os no capítulo A Existência Consentida, frase essa que ocorre num trecho de um dos meus versos.

Finalmente, entre 2003 e 2005, me dediquei a escrever poemas de amor. Compõe a alma deste livrinho. São versos sobre amor amical, filial, sensual, circunstancial e mesmo incondicional. Tentei esgotar todas as tradições metafóricas a respeito do amor, na medida das minhas capacidades, é claro. As fontes são inesgotáveis: Platão, Drummond, Vinícius, o monumental Lêdo Ivo, Pablo Neruda, Chico Alvim, e.e.cummings, Sappho, Rainer Maria Rilke, tantos e tantos mais. Ao título do capítulo só cheguei este ano: Manual para Amadores. Penso que modestamente possa contribuir para uma espécie de educação sobre o amor.

Procurei manter a ordem cronológica segundo a qual os poemas foram escritos. Ma com duas importantes exceções: primeiro, às vezes alterei tal ordem, com o intuito de melhorar ou facilitar sua recepção (alternando poemas mais ligeiros com mais graves, por exemplo); segundo, inverti os capítulos segundo e terceiro, para poder dar ao leitor o vislumbre de que há várias formas de amor, e que, talvez, a mais bela, seja a que chamamos solidariedade ou amor à humanidade e às formas de vida. A par disso, há neste volume um considerável montante de poemas escritos em outras línguas que não o português. Nesse caso, não quis aborrecer o leitor apresentando-os misturados aos demais, coloquei-os simplesmente na tradução portuguesa que eu mesmo providenciei. Insisti em mantê-los primeiro porque ao fim realizei traduções que me soaram ao menos satisfatórias, mas sobretudo porque alguns compõem a própria ossatura do livro e, à sua falta, talvez a este Inverno faltasse ainda por cima um coração. As versões originais seguem num apêndice final, a quem interessar possa.

Bajulações de Praxe

Estive gravemente doente a partir de 2005 e não fui digno daquele amor incondicional daqueles a quem sempre me dediquei e com cujo apoio acreditava merecer contar, amor cuja menção tantas vezes ilumina estes poemas. Deixem estar, não sou do tipo rancoroso, águas passadas não movem redemoinhos rsrs, e, balanço feito, é preciso saber amar, mas também é preciso saber escolher a quem. Mas sempre tive o amor dos cães como todo solteirão, em especial de meu filho Límiti, sob cuja inspiração eu escreveria na sequencia meu ditirambo em homenagem às matilhas dos cínicos viventes e extraviados (Invitation to an Island). Mas asseguro que não sou desses mal-amados que se refugiam no convívio com animais por rancor à humanidade. Amo tanto os homens que lhes estendo este resultado de meus esforços e espero com avidez a generosidade de suas críticas pertinentes e mesmo destrutivas. Que escutem um pouco da minha voz, que é o maior presente que podem me oferecer. Se divirtam e que a felicidade, que se diz só bater uma vez a cada porta, se engane de endereço e os abençoe repetidas vezes, meus irmãos!

Agradeço ao meu melhor amigo, o tempo, o qual me permitiu melhorar incansavelmente estas linhas, mas me arrogo nesta oportunidade a propriedade inalienável e intransferível de todos os desacertos, desleixos e exageros que possa ter cometido.

Nesse ponto, noto que abomino as tentativas da autoridade política em decidir acerca da correta ortografia das palavras. Costumo me ater a essas regras autoritárias apenas para não colapsar o sistema informacional de meus solícitos editores, mas o complexo ortográfico imposto pelos políticos é tão inconsistente que é impossível deixar de incorrer em supostas incorreções. Tarde demais para uma reforma: com a difusão da educação, nossa defeituosa escritura se solidificou irremediavelmente. Mas há sempre brechas. Por isso, confiem em mim: meus aparentes erros são na verdade acertos de quem venera e compreende mais a língua que um burocrata ou um douto fossilizado. Um idioma pertence ao patrimônio cultural de um povo, não pode ser decidida por decretos, nem tem ninguém autoridade de impedir ao criador ousar os desvios que julgue interessantes ou necessários. Previno, enfim, que me repugnam os solecismos lógicos e verdades contrafatuais da gramática de estilo, que não merece a consideração nem sequer de uma inteligência modesta como a minha.

São Paulo, 24 de setembro de 2011.

P.S. Aproveito ainda para esclarecer que pequenos números claros postos ao lado das estrofes não indicam contagens de linhas, mas sim o metro dos respectivos versos. Assim, um "12" ao lado de uma estrofe significa que a stanza é composta de dodecassílabos. Quando há cesuras ou quebras, são indicadas apenas para o verso em questão, não valendo a observação para o resto da estrofe. Alerto que minha metrificação obedece a critérios contemporâneos e ao verdadeiro jeito com que falamos português no Brasil, da mesma maneira como, quando metrifico em francês não conto sílabas mudas pela singela razão de que, em detrimento da empoeirada tradição, elas simplesmente não existem. Então porque eu, que não tenho o dom de ver fantasmas, me daria ao trabalho de fingir que tenho clariaudiência espectros? Como exemplo, cito os “haches aspirés” (como em “hauteur” ou “héros”, que não poderiam ser elididos com uma vogal anterior porque seriam aspirado, como o “h” inicial do alemão..., surreal, não lhes parece?, embora tais aspirações não sejam mais pronunciadas há mais de trezentos anos, e o caso todo só pode mesmo ser atribuído a um velho complexo de inferioridade de meus parentes franceses em face dos alemães (logo de quem!, mas gosto não se discute...). Ou então os “e”s átonos finais, e às vezes intersilábicos, que não são pronunciados, como o “e” de “je” ou “carrefour”, salvo numa tosca e exagerada pronúncia parisiense. O mesmo ocorre em português, observem: o verso “poetas tradicionais se reúnem em saraus”, quantas sílabas tem? Obviamente se trata de um dodecassílabo e ainda alexandrino com acento agudo na 6a: “pwe-tas-tra-di-cio-náis-se-rew-ne˜-nhem-sa-raus” (por “w” denoto não o “u” que no português usamos em sílabas tônicas, arredondado e bem articulado, mas o que pronunciamos em sílabas reduzidas, como os “os” finais das palavras paroxítonas, e que mais se assemelha ao ”u” de “Maus” em alemão ou “good” em inglês). Agora me digam quantas sílabas contamos em “ele cursou a faculdade de medicina”? Temos de novo um dodecassílabo, com acentos na 4a e 8a, pelo simples fato de que a última sílaba de “faculdade” é foi e será sempre muda. Diga a frase em voz alta e ateste como não digo nenhuma asneira. No caso do inglês, havendo uma abundância de alófones, me sirvo do que melhor convém ao verso em questão (assim, ‘beer’ pode valer, conforme a conveniência e a altura do colarinho, por uma ou duas sílabas (“bi:” ou “bi:â”). Já em italiano, espanhol e alemão, a metrificação tradicional conserva em linhas gerais sua validade, salvo no caso das terminações do infinitivo alemão que, por fidelidade à pronúncia real, deve ser ignorada, pois significa um mero ressoo nasa e não uma sílaba distinta (assim, o verbo “warnen” é, a despeito da aparência, uma oxítona e pronuncia-se corretamente “va:ñ”), considerando-se ainda que o “e” final átono em alemão pode ou não ser reduzido, indiferentemente: tanto “hét” quanto “‘héttâ” são alófones válidos para “hätte”. Peço desculpa pela maçante digressão técnica, mas é sempre bom se precaver contra os chatos de plantão, os quais, por estranha coincidência, costumam ser exatamente aqueles pseudo-intelectuais menos cultos e informados.


Monday, April 23, 2012

EL SENTIDO DE LA PÉRDIDA



Un rojo desde el suelo 
se levantaba hasta tocar el cielo.
El día, nomás acostado, 
como si tardara en desangrarse hasta finales,
desde ser sacrificado en el ocaso, 
ya se despertaba, tocado de los dedos
bermejos de aurora. 
También las casas parecían pintarse ahora
las caras de humo y sucio de estrada,
para vigilar desde las pestañas bajadas
la llegada de visitantes adelantados 
delante de las barracas al borde del mercado. 
Zapatos huecos besaban las aceras 
como si bailaran al ritmo de las guarañas 
que desbordaban bajo las puertas, 
unas viejas, además de las más novatas.
Y, de la misma manera, 
era tan noche como mañana,
tarde demás y demasiado temprano.
Un rojo sólo rojo como si lloviera 
sangre sobre la tierra entera
nos ahogando 
desde la vigilia 
hasta las pesadillas.
“¿Quién era el tipo que Le acompañaba?”.
Ella tenía algunas décadas, la espalda curvada,
sobre la cabeza un blanco recalcado que quisiera
explotar de su cabellera. 
Dijo algunas cifras espantadas –
no bien comprendidas para un intruso en portugués,
fechas, direcciones, números de pasaporte,
de quien se contestaba, nada guardaba,
sino en la boca una copa de besos
echados a perder, más nada.
Pedro Juan Caballero: de éste caballero, sí, me acuerdo,
El corazón yermo llano como los brasileños, ricos y pobres,
y lleno de chicas recién llegadas, tan lindas
si las comparas con nosotras de más edad,
a nosotras nos toca le belleza postiza de maquiajes y tintas
escondodidas na penumbra en la que ve menos de cuanto se imagina.
Mi habitación, la compartía con otros vasos sin ganas,
que tendían en los dedos sus cigarrillos muertos.
Había un devano heredado, ¿o la memoria me engaña,
tendría sido hurtado?, al alquilarlo, ya estaba allá 
sobre el que también volcada y fumando me creía
colmar de falsa languidez indolente
el sin-hacer en las orillas del río-corriente. 
Porque estuve menos hermosa, menos lista al amor,
yo misma, la callejera, conduje desde la china
Ciudad del Este, hacia Curitiba, 
la polaca. Tal vez porque un clamor
desde el mar a todas nos invocaba serenas.
Y todas las ciudades por las que pasamos 
nos ofrecieron sus virtudes venales:
en las tiendas, bares y hospitales,
y todos los sitios donde pasamos o no tardamos siquiera,
con tal de que pagáramos el precio establecido,
fuimos muy bien acogidos.
Poco a poco - más gente, coches, ruido,
más mundo bajo las estradas.
Desde Paraguay las ciudades se concentran,
luces se encienden, las cosas pesan,
máquinas se aprietan, colorean las imágenes.
Tal vez porque Paraguay es el margen,
y Pedro Juan Caballero,
el margen del margen.
Peregrinamos torpes como quien buscara
sentido o respuestas, pero sólo escuchara
el gran silencio de la taza de piedra calcárea.
Ella me miró con sus ningunos ojos como si me preguntara
y me calló con sus millones de voces como si me contestara.
Yo no sabía qué decirle ni más me detuve,
saber es peligroso y no suele premiar cómplices.
Al fin del periplo, delante a nuestra mirada agotada
por el lucero de los anuncios y el humazo de las fábricas
se alzó fálica la Ciudad Abstracta.
Ciudad sin horizontes, toda muros,
ajena a la Tierra como una palabra.
Ciudad hecha de aire y de nada.
Yo no intenté leerla, pero se diría
una epístola de amor remitida
a hombres que, por hábito de desveer,
la hubieran devuelta sin más verla,
pero cuya indiferencia la convirtiera 
en una  maldición de todo lo existente
culpable o inocente.
La claridad difusa en la tarde magenta
se nos arrojó sobre la cara
como agua olvidadiza que nos lavara
de las certezas más tercas.
Se consustanció en nube espesa 
que toda la mirada empañaba,
cumpliendo una promesa de opacidad
a manos callosas de objetos distintos.
Después se disipó en su ubicuidad de pulpo y polvo.
Y los pasos quedaron pastosos, 
y las calles daban a esconder sus destinos 
como a secretos mal guardados,
atravesados constantemente 
por una apurada gente.
Pero donde, quizás por olvido, se sigue
arreglando las cosas de siempre:
se hacen compras, se produce gente, 
se construyen almacenes, 
se miente al mundo, 
se calcula lo que se pierde, 
y enseguida se conciben
pretextos más seguros.
“¿Usted no acompañó  los policías mientras sacaban
el narcótico desde el coche que manejaba?”
Ella sabía y no sabía qué decirles.
Todo le parecía un desierto de sentidos:
no lo sinsentido de lo inquirido, 
pero la respuesta que tema en reírse,
no la memoria de lo pasado,
pero lo vivo detrás del memorado.
Pero de mí se olvidan los caminos de volver.
Se me olvida la muerte, mi condena es vivir
entre calles y rostros apagados, que disfrazan
un sin-rostro por detrás de los rostros.
Y nada quedan de historias nombres humores
que antes rellenaban cuerpos.
¿Por que me persiguen sombras de los hombres,
como a una criatura rechazada en la penumbra,
si no traigo contado, no traigo culpa,
para que les dé o me los roben?
¿Qué ojos de almas amontonadas
me observan desde los desechos?
Hay curiosidad en la manera como acechan, 
ternura en el cuidado con que intentan 
ajustarse al nuestro desprecio.
Más nada no se me acuerda, les digo. 
Pues siempre he perdido todo lo que estuvo conmigo.
Los días me dejaran como los novios,
citas, fechas, autobuses que pasaron antes de lo previsto.
Y siempre pierdo todo lo que he tenido,
incluso el olvido.
Y si hubiera al menos un momento,
que suspendiera la sucesión de los eventos.
Momento hecho de sueño y materia,
antes del remordimiento y de su pérdida,
momento para el recuerdo o para el invento
de una música de esferas.
Pero ya no había más tiempo.
Pero ya no había más tiempo.
Un día, el silencio abandonó mi garganta
y llevó consigo mi voz por engaño.
Ésta se elevó en el aire
y se desparramó sobre las calles.
Luego, se aleteó allá de las manos,
como siempre suele una esperanza.

LE MANQUE DE QUI NOUS MANQUE


... and my friends will say that I
am quite myself again
(Robert Lowell)
Sie war in sich, wie eine hohe Hoffnung,
und dachte nicht des Mannes, der voranging.
(Rainer Maria Rilke)

Une de ces journées, je nous nous sommes retrouvés par la rue,
et tu m’as salué toute étourdie. Comme un connu
que l’on regarde et avec lequel on discute à son propre insu,
mais qu’au dedans ne puisse pas entendre qu’une chanson 
repérée à la distance. J’ai pensée: une de ces journées,
moi aussi je vais tomber sur un autre en m’en rendant compte.
Il arrivera un jour auquel le manque de qui vous manque
se sera exponentié dans le manque du manque. 
Et ce manque ce sont des mots desincarnées des langues,
des bras qui se brisent avant de s’embrasser, 
des pas qui se dissipent avant les pas. 
Mes amis, s’ils me verrons, ils ne me trouveront pas autre. 
Ils m’inviteront pour du vin. Ils jugeront mon absence drôle.
Ils diront que c’est comme si j’aurais passé un temps à l’étranger,
mais que je suis de retour malgré tout, et plein d’histoires à raconter.
Cependant, tel les autres passants souriants ou expectants 
qui vite se perdent de vue après s’être serrés les mains
et qui toujours affirment qu’ils resteraient encore plus
mais jamais n’y arrivent, c’est le boulot, l’horaire des trains,
des milliers de raison pour qu’ils suivent, j’ai commandé mes saluts
et j’ai poursuit mon cours. J’ai ruminé: l’amour, ça doit être 
la chose la plus triste au monde, l’amour qui jamais n’a su
des autres choses et plus que tout est seul et dépourvu.
Il ne veut pas être autre chose, il ne heurte pas avec d’autres corps.
Il ne perd pas ses barbes et ses arêtes, 
et ne désiste jamais des ses raisons,
même quand il n’en est pas revenu encore.
Il ne sait pas changer de peau, ne sait pas tenir bon. 
J’aurais voulu tirer ta main et joindre nos chemins,
mais j’ai compris néanmoins que je rien ne toucherais.
C’était comme si la chair l’un de l’autre n’aurait laissé de trace
que dans notre mémoire, chaque jour plus fade.
Et maintenant, changés en ombres, on pourrait au moins
poursuivre libres et sans blâme comme seulement peuvent faire 
ces distraits qui n’ont jamais connu l’amour hors du dictionnaire.
Puisque, en en faire la connaissance, on sait déjà trop, on devient fou,
au deçà de la faute, mais aussi au delà du pardon.
À vrai-dire, nous ne sommes jamais été voulus par les dieux,
qui nous avons souvent conçu en rapt et en feu.
Et lesquels nous ont faits frêles aux malheurs et tout d’un coup.
Nous sommes de enfants laids, nous n’avons jamais
eu des privilèges à la maison. Personne ne tentait un mot
consolateur si la nuit chassait des recoins nos refoulements,
ou si les couloirs dégageaient des voix qu’on ne comprenait pas.
Peut-être il n’y a jamais eu un foyer pour nous, et seul nous restât
couler sans répit, comme l’eau des miroirs.
Ou alors il n’y a guère eu de l’eau 
et nous nous sommes mis éternellement à sécher, 
comme un fleuve qui ne sait pas où aller.
Et ainsi, privés de cours, nous égouttons vers le rien,
et sommes et ne sommes pas, incessamment. 
Surtout les dieux abominent les arts des humains,
et punissent les poètes en leur agréant les plus terribles envoûtements,
puisqu’ils insistent en apercevoir des fantômes là
où rien ne se voit, et peuplent le monde avec des songes,
comme si les songes n’existaient pas
de la même façon qu’il n’y a personne.
Mais le étoiles se sont allumées pour nous lors de notre naissance,
et les couleurs ont attendu nos paroles pour venir éclairer le monde.
Et car nous nous sommes devinés condamnés à périr à sa perte,
tout ce qui nous est resté a été d’aimer la vie et de nous attacher
à tout ce qui nous échappe et qu’on ne peut pas empêcher de passer.
Sous l’empreinte légère de tes pieds, il n’y avait pas de terre.
Le vent des événement soufflait sans bouger ta frange. 
Tes yeux éblouissaient tes gestes, au lieu de les déceler. 
Et noms, non, tu n’en avais point, commes ceux qui n’ont pas eté nés.
Pour tout cela, si j’ai retourné ma tête pour te regarder,
ça n’a pas été pour ainsi te garder,
mais plutôt pour te perdre une nouvelle fois,
car l’Amour ne se tient pas
tout seul dans celui qui l’a.

UN CERTAIN DON DE TAIRE, LEQUEL NOUS AVONS TU


Si les autres n’étaient pas des imbéciles, 
nous le serions.
(William Blake)
que c’est ennuyant
de s’assoir sur la terrasse d’un café, 
un café où tous ne cessent pas de parler,
qui parlent entre les présents,
qui parlent aussi assis à leurs tables
à leurs portables
que c’est ennuyant
de se rendre enfin compte
comme
ça gêne d’être tellement plus pauvre
la vie (ou leur semblant)
des autres

FEUILLES MORTES



Novembre, nous plaignant, éternue,
et les fenêtres tremblent timorés. 
Novembre fait pleurer les marbres 
et danser les arbres,
arrachant les feuilles des calendriers. 
Une bruine têtue
arrose de nos corps et nous débarrasse
des croûtes de l’argile plus ancienne.
Et nous nous dégageons de plus en plus
sous le vent qui partout nous traîne,
jusqu’à ce que nous gisons amoncelés 
en couches de générations de feuilles tombées.
Mais nous nous refondons aux cendres notre haleine
et nos membres frêles se lèvent des ténèbres, qui l’aurait dit?,
nous envolant vers la lointaine 
comble du midi.
Novembre condense les brouillards en glace,
rendant l'air irrespirable,
dans l'attente acharné d'un soleil
qui tardera à croiser le seuil.
Ces vers sont les témoins,
indécis, rechignants,
de ce qu'on pourrait appeler chagrin
mais qui est l'empreinte seulement
de l'accablante volonté de l'impuissance.
Pour cela il se révèlent bruit à l'ouï,
insensés à l'esprit.
Et plus on souhaite qu'ils se taisent,
plus ils se mettent à crier et grimpent les falaises
de nos gorges muettes, 
beaucoup plus aigus
que nous les avions conçus. 
Novembre repose sur les lauriers de l'oubli.
Tant de songes et mensonges
n'ont laissé trace sur quiconque.
Tous dorment en soldats pétris,
usés des batailles périmées, toujours ajournées.
Il est des milliers d'intifadas 
auxquelles on ne croit vraiment pas.
Et, à tout lever,
le matin nous accueille en tenue de routine,
qu'il faut tremper de sueur pour l'échanger en suite
pour des balles, qui avilissent, mais qui nous accordent
une existence permise en régime d'urgence;
de la liberté, qui est pure possibilité, en vente
selon les taux de l'offerte et demande;
et de la dignité, qui, malgré le beaux propos des écoles,
ce n'est que d'avoir où aller et comment nous le payer.
Novembre tord ses grimaces,
mais ces mêmes rafales qui lui parsèment les cheveux
et plie les essieux 
des gratte-ciel les plus inébranlables,
novembre a secoué chez ma légèreté
des aciers indéfrichables:
quelque part je couve un diamant,
chez moi je vais faire la trouvaille
d'une forteresse imprenable, 
gardée du courage
d'un coeur qui s'impatiente et s'éclate
comme une bombe, mais qui ne tue personne, sinon
me rend du coup plus vivant au dedans.
La girouette montre que novembre vente trop fort, 
mais chaque jour nous nous réinventons
plus fous encore.

LA CONSOLATION DE LA POESIE



I
Il est midi pile, et la marche des heures accomplit
au bleu une arche infinie
sur la toiture sans couture de Paris.
Plus que des mots, des gestes mûrs se dégagent des murs
tatoués qui servent à démarquer les propriétés,
corps, libertés de aller e de venir, souverainetés.
Mais le temps court si vite, qu’on dirait qu’il nous dépasse hors-jeu,
donc, si on veut le rattraper,
il est mieux de raccorder nos pieds,
sans risque de nous écarter ou d’en dévier les yeux.
Il faut alors que je prenne mon déjeuner
et sorte pour me promener le chien 
et mes membres engourdis de la fraîcheur su matin,
en me rendent vers l’obligatoire marché,
devoir de qui se trouve en convivialité. 
Parce que nous sommes, au-delà des utopismes,
au fond de fait identiques, 
or, nous sentons tous faim, soif et sommeil,
appétits de bonheur, de justice et beauté,
tracs et craintes, désir sexuel 
et toutes les autres circonstances qui conforment l’ainsi-dite
essence humaine ou son inexistence plus précise.
Car nous sommes égaux par nécessité,
et seuls nous séparent
des piètres contingences superficielles,
de nuances de peau, gendre, croyance,
couches ou tenue sociales, 
verbiage ou argot. 
Car nous sommes par nécessité égaux,
et nous allons tous à la place,
et tout ce qu’on y fait c’est notre commun propos
ou notre commun héritage, 
et tout ce qui s’on y dit ou reste omis 
c’est de notre avis.
Donc, je rouvre ma porte et la délaisse ouverte,
mes clés, je les ai ratés, 
mais je compte aussitôt me retrouver
à l’égal perdu 
parmi tant des détours qui nous guettent. 
Sur le chemin, je faillis être renversé 
par des foules de hommes affolés.
Mais s’ils risquent un salut
ou un sourire timoré,
je redoute qu’il n’y ait personne sous leurs gestes vidés.
Il demandent n’importe quel direction,
mais ils ne se trouvent ni ici ni à destinations,
là où les apporteront les sens insensés 
des rues enchevêtrés.
Je réfléchis que ces chemins mi-éclairés 
des rues longés d’édifices de commerce 
vertement me déplaisent 
parce que je préfère la sale lumière 
de la journée tombée à pic tell un fard à paupières
aux couleurs en biais et aseptiques 
des panneaux d’affiches et des vitrines,
qui font éblouir aux vues une folle cécité
qui interdit les miroirs et la solidarité.
Mais je ne désire pas d’autre monde, 
puis que je m’en occupe déjà du nôtre. 
De même, je ne ressens pas envie du ciel,
puis que je le tiens sur mes épaules 
et peuvent m’alourdir autant qu’une stèle.
Je n’envisage pareillement pas l’ombre,
du moment que je la traîne accroché aux pieds,
pour le cas d’excès de paix ou de danger.
Or, je parasite toujours ma chair, 
et ça seul peut me satisfaire, 
puis que je continue comblé du sol qui m’enfonce
jusqu’au bout des mes ongles,
renfermé sans conditionnelle dans une ville
où j’assiste, 
sur les chemins de paralysie et de vitre, 
aux corps inoccupés
de ceux qui n’ont pas encore réveillé. 

II
Je reviens à la maison
laissée en abandon.
Épreuve matérielle de la totale inserviabilité
des agents immobiliers. 
Elle n’abrite plus depuis longtemps des habitants,
mais alors insiste en loger 
des mémoires et revenants.
Elle a sa propre volonté et sa propre moteur.
Si des colombes se nichent dans les interstices des heures,
cela est parce que une ombre encore plus grande
n’est pas tout de même pesante
et s’envole vite d’une vitre brisé ou béante.
La lampe de la cuisine éternise
une cohabitation métallique dans le vide
autour d’une table débarrassée.
Des échos sporadiques
répètent les creux des buffets.
Plus avant, depuis les escaliers,
les marches en bois tantôt aboient, 
tantôt gémissent, 
faute de pas.
Dans un couloir, un vent s’est installé
en hôte définitif,
malgré la rénitence des portes et du tic
congénitale de les isoler au vif.
La douche disperse l’eau 
du labyrinthe des tuyaux
au lieu de la guider dans sa chute.
Et il serrait si simple de la faire réparer...
Toutefois, il se serre les dents, il lutte,
têtu comme une mule,
en dépit de l’art des plombiers
et des efforts gênés et impatients
d’un visiteur aussi obstiné 
mais peu au courant 
des anicroches du bain,
qui se désespère, qui vitupère, qui gronde,
et ensuite cherche le torrent soulageant
de l’eau chaude,
mais se résigne et enfin s’effondre
dans le défi de déchiffrer
dans l’embrouillement des robinets
où se cache cette espèce de maneton
qui sert à tirer la courroie du bouchon.
Il y a tout un rythme qui ressort des boyaux,
des toilettes et lavabos, 
ainsi que des chiens
qui disent salut aux humains 
depuis l’arrière-cour.
La maison entière est de sa façon
une orchestration dans ou hors-saison
de gazouillements à vent et de craquements sourds, 
de poufs sans raison et des cordes des jurons
dans une parfaite harmonie de cours.
Je suis le fantôme ou pitre
aux prétentions de titre.
J’y 
suis le bruit.
III
Si des lettres me cherchent, renvoyez-les sans retard.
Je n’y suis ni pour les factures ni 
pour n’importe qui.
Congédiez le postier en lui souriant lorsqu’il repart.  
Dites-le que je me suis égaré à mon gré.
Ainsi que se perd une balle dans une écharouflée,
ou comme se cherche en vain
une aiguille dans une botte de foin.
Ainsi que l’on vite s’en éloigne
dans les discussions d’amour la vue du point.
Ou comme on souvent s’écarte 
d’un chien en mégarde de la promenade,
ou, enfin, tel que la compassion, en excédance,
se déroute vers l’indifférence.
Si des amis m’appellent au téléphone, 
informez celui qui sonne
que je ne veux pas qu’ils se dérangent 
en remarquant mon absence.
Qu’ils ne s’en fassent aucun souci, 
ni ne polluent mon repli
par des annonces de disparu ou par le fracas éparpillé de pas.
De sorte que tout bruit se garde 
pour l’oreille muette des parois,
ou pour la curiosité inné du voisinage. 
Et que si les oiseaux imposent le silence 
à l’azure, soit-il pour révérence,
et non pas pour m’offrir des condoléances...
J’ai besoin de demeurer seul pour que, 
quand je puisse retourner,
j’arrive à reconnaître comme les vôtres 
les larmes à m’éclarer le visage sombre,
celles que mes yeux vous ôtent,
bien que je ni ne les mérite ni n’en rende d’autres.
Mais la solitude comprend, du moins, la moitié
de notre nature mêlée,
et il faut désormais s’y habituer:
des jours nous visiterons avec ses bras qui se cassent
avant qu’ils nous embrassent,
et leurs yeux souriants,
nous n’entendrons plus ni n’arriveront
à apercevoir ce qu’ils diront.
Ne m’attendez point.
Si vous devez partir, ne vous détenez pas. 
Un jour la voix surviendra au soin,
mais, pour l’instant, tout ce qu’il y a
c’est son manque. Réassurant,
un silence nous dit des mensonges.
Et une sueur nerveuse et pleine de honte
écoulent des mots. 
Elles sont devenues insensés, 
elles déraillent nos propos,
et se lavent nos erreurs des leurs mains,
en attente des matins
qui tardent encore de trop.
IV
J’avoue que les hommes ne sont pas faits pour ouïr comme une conque,
ni n’usent retourner en amour l’amour qu’on leur donne. 
Ils savent qu’ils doivent assassiner les choses qui les entourent,
et qu’il leur faut poursuivre leurs travaux coûte que coûte,
pour pouvoir ainsi assouvir le monde e s’acheter sa bouffe.
Et qui sait une amertume tresse
la trame profonde de nos gestes:
nos actions, que de douleurs elles apprêtent,
même lorsque inconscientes ou involontaires, 
nos laisser-aller et laisser-faire
blessent de telle manière 
que le mal semble être
banale et en plus nécessaire, 
tandis que la bonté
paraît plutôt pareille 
à une bravade cinglée,
ou à une maison toute belle, 
mais privé de plancher.
Et pourtant, nous pourrions la doter, au minimum,
d’une nécessité sur le pied, 
non pas formelle ou à coup de référendum,
mais concrète, 
telle un plat ou une fourchette,
au lieu d’insister à ruminer les remords
d’un enfant que nous n’avions plus espéré.
et qui dans le brouillard d’où il s’est généré de son ressort,
nous sommes demeurés incapables de lui accorder un corps.
Par contre, en nous reposant au sommeil des idées rebattues,
nous dormons une paix qui est moins paix
qu’une renonce au vrai:
la paix sans paix, la paix des disparus,
la paix des armes empoignées,
le faire-taire des gendarmes sur les pavés, 
l’omniprésente et millimétrique
paix cosmopolite,
la paix capitaliste,
la paix des ingénus, la paix mûr
tombant sans balance de chaque côté du mur,
dans la paix qui gît dans les tombes,
la paix qui prend des rondes.
Ça ne sera pas la paix
qui va m’offrir relais.
Je regains donc en solitaire
la maison exorcisée des mythes,
par où une crevasse de éclairage puisse faire glisser
de la dalle infinie des possibilités
le fantôme proscrit d’un monde à présent négligé.
On dit que revenants ne sont plus vraisemblables, 
mais je mas soupçonne que maintes de ces fables
nous permettent encore de rêver
et nous accorde leur don de réalité.
Et qu’une belle matinée,
récemment levés, reprendront à nous hanter,
même que par coïncidence ou par hasard,
malgré notre aversion au contact,
même que par simple manque 
ou épuisement des sujets de canulars.
Et ce jour-là
on se retrouvera
finalement ensemble.