dia de maio,
chocando a pino nas esquinas,
sem a greve de sexo inconcebida
nem a prometida revolição dos humores.
somente a justaposição
de umas pernas que vem e que vão
e, terminados os trabalhos,
sentam-se em viaturas lado a lado,
às vezes sequer se conversam,
senão ruminam uns segredos de polichinelo
com a solenidade de um relatório de cisão.
não a subtração de algo que nos pertencesse
ou tivesse se perdido como um guarda-chuva
(e ninguém fizesse caso),
não o sonho que em sua língua de milagres
mostrasse o caminho ao sentido
ou ensinasse a viver mais.
porém uma tropa de incêndio que avança contra o tráfego,
os direitos escalavrados em nome do bem geral,
a adolescente que se picava de vez em sempre,
os pais poupados pelos parentes -
por favor ninguém pergunte.
a soma de todos os males,
os naturais e os humanos,
os males de exceção e os males prosaicos,
os por engano e os farisaicos,
os males não-revelados e os prontos ao consumo,
ou apenas mais um
dia de maio fluindo
anêmico como o jornal sem notícias,
trivial como cadeira ou copo,
mais gênero que instância.
sem qualquer traço incomum.
distendo a vida entre dois confortos duma vida pequenamente burguesa,
me digo que quanto importa é eu estar vivo agora,
sou errado e me entendo com os meus sentidos,
que tenho eu justo eu justo eu a ver com tudo isso?
o dia logo será amanhã, e eu também outro.
como fazer renascer de si mesmo o dia de maio
que nos escorre das veias e que morre aos poucos?
mas, sem sangue sem substância, talvez nada haja
atrás dos gestos e palavras, talvez não haja o dia senão como signo:
as inscrições parietais de um mundo caduco
para remotos escafandristas já desaprendidos de enxergar.
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