Novembro nos carpe em São Paulo,
e as janelas tremem de medo. Novembro põe
as árvores para dançar, arranca
os dias das folhinhas.
Uma chuva fina
orvalha dos nossos corpos e nos lava
da argila mais antiga.
E vamos despegando aos poucos,
até jazermos amontoados como gerações de folhas quedas.
Mas logo nos remoldamos em barro e cinza,
para rompermos das sombras, quem diria,
revoando rumo ao meio do dia.
Novembro se condensa em São Paulo,
enquanto cumpro aprumado a rotina
da espera de um sol
que não se anuncia.
Estes versos são testemunha
esquiva, empedernida,
do que seria secura, mas é só usura.
E por isso se digerem duros,
e por mais que os desejasse frios e mudos,
aí é que gritam e descem mal,
rasgando-me a garganta com suas unhas
mais incômodos do que nunca.
Novembro se esquece em São Paulo,
e não guardamos lembrança de nossos sonhos e mentiras.
Dormimos em soldados inertes, prostrados das batalhas perimidas.
São milhões de intifadas diárias nunca tentadas, quem sabe sequer queridas.
E quando despertamos, a manhã nos colhe em mangas de camisa,
e é preciso suar o dia para trocá-lo em seguida
por dinheiro, que avilta, mas que entre nós significa
existência consentida, em regime de urgência;
liberdade, que é possibilidade pura, à venda
em termos de oferta e procura; e dignidade,
que, a despeito dos discursos, é no fundo
ter como ir e onde pagar.
Novembro increspa em São Paulo,
mas o mesmo vento de novembro
que estiola as palmeiras e retorce
o esqueleto dos espigões mais altos,
novembro bramiu em mim uns aços inopinados:
em algum lugar eu gesto um diamante,
em algum lugar eu preciso ser
de fortaleza mais que inquebrantável
e do mais puro valor.
Novembro venta em São Paulo,
mas nós nos inventamos
um pouco a cada dia.
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